sexta-feira, 30 de maio de 2008

De patinho feio a cisne

por Adriana Cotias e Danilo Fariello de VALOR
30/05/2008

A confirmação do grau de investimento pela Fitch Ratings marca o início de um novo ciclo para o Brasil. Se no começo da década havia a expectativa de que o selo de economia não-especulativa representaria grandes saltos para os ativos locais, a percepção, agora, é de que muito disso já está nos preços. No longo prazo, a chancela de menor risco aos olhos do capital internacional significa maior fluxo para o país, menor volatilidade, mas potencial reduzido de retornos extraordinários também. O investidor terá de se habituar a tempos mais previsíveis. No curto prazo, as tendências para bolsa (de alta), câmbio (de queda) e juros (também de alta) não se alteram significativamente.
À medida que seguradoras e fundos de pensão estrangeiros aumentarem a parcela de investimento dedicada ao Brasil, as ações, os títulos públicos e o real tenderão a capitalizar o ingresso desse dinheiro novo. Mas as movimentações estarão mais do que nunca condicionadas a fundamentos e menos a especulações. A elevação da nota brasileira já se concretizou, diz a estrategista de investimentos do UBS Pactual Wealth Management, Juliana Centurion Braga. "Ninguém descobrirá o Brasil agora." Para ela, não haverá mais grandes eventos que manterão os ativos brasileiros em ascensão tão forte e tão distante do mercado mundial. Tudo agora passa a ser mais gradual, diz. "Se o risco do Brasil ficou menor, o potencial de retorno no curto prazo também."
Mesmo antes da conquista do grau de investimento, muitos investidores institucionais estrangeiros já podiam aplicar aqui, conforme as regras dos respectivos estatutos. O que muda agora, com as notas dadas por duas agências de classificação, é que aumenta o percentual que os aplicadores com perfil de longo prazo podem distribuir nos diversos mercados, diz o chefe de mesa da HSBC Corretora, Jorge Augusto Miranda. "Tendo em vista nossos clientes estrangeiros, o potencial de aplicações por causa do rating novo é muito maior do que o volume atual", afirma. "O grau de segurança passa a ser maior e isso se emenda com a fusão das bolsas, um fato muito positivo do ponto de vista institucional."
Para Miranda, a queda de 1,85% do Ibovespa ontem é um indício de que não só o "investment grade" já foi em boa medida antecipado, como também é uma demonstração de maturidade. "O hoje já está no preço, mas o que vamos ver no futuro é uma maior consistência nos movimentos." O incremento do fluxo estrangeiro não será relevante para mudar tendências de curto prazo, ratifica Alexandre Maia, gestor de fundos da GAP Asset Management. "O selo corrobora tendências que já existiam."
Nos próximos seis meses, a alta das commodities, o aumento dos preços dos alimentos e as pressões inflacionárias tendem a ditar a dinâmica de preços dos ativos locais, mais do que o grau de investimento, diz o diretor de Renda Variável da Unibanco Asset Management (UAM), Ronaldo Patah. "Os juros vão subir forte até o fim do ano e isso deve desacelerar a economia em 2009, resultando num menor crescimento para o lucro das empresas." É por isso que ele mantém, desde novembro passado, a sua projeção de Ibovespa na casa dos 80 mil pontos para dezembro.
Ao ampliar o leque de recursos que podem ser alocados no Brasil, o "investment grade" tende a levar a um juro real potencialmente mais baixo para o país no médio prazo. Bom para quem quer se antecipar a esse movimento nos títulos da dívida brasileira, seja nos prefixados, seja nos papéis atrelados a índices de preços, diz Patah.
Juliana, do UBS, também acha que as taxas de juros em papéis de longo prazo são gordas atualmente, mas ela alerta que, na marcação dos títulos dia-a-dia, o investidor poderá verificar uma oscilação muito forte e terá de ter estômago para agüentar esse vaivém. A especialista reitera, porém, que investir em renda fixa no Brasil ainda é um ótimo negócio, dada a própria alta taxa paga internamente e, mais ainda agora, pela ratificação de que o país tem pouco risco de crédito.
A visão de Maia sobre juros é bastante variada quando se trata do horizonte mirado pelo aplicador de renda fixa. Para o prazo de até um ano e meio, não há nada que indique que o movimento de alta da taxa básica da economia vá parar. "Não é claro se os prefixados já embutem toda a subida possível", comenta. "Já em prazos de cinco anos, porém, o juro certamente é muito alto para um país com grau de investimento".
O ciclo de aumento do juro brasileiro representa uma certa contradição para o Brasil, nesse momento em que o país recebe o aval de bom crédito por duas agências de classificação de risco, diz a chefe de análise da Ativa Corretora, Luciana Leocádio. Ela imagina que, no ano que vem, esse movimento já poderá ser revertido pelo Banco Central. Os setores mais beneficiados na bolsa tendem a ser bancos, varejo, construção civil e as ações das próprias bolsas, que vão se beneficiar do maior fluxo para o mercado local. Na renda variável, as companhias vão se beneficiar pelo acesso a capitais a custos mais favoráveis, diz Patah.
O primeiro impacto do novo grau de investimento será no câmbio, com o dólar podendo até romper a barreira de R$ 1,60, acredita Newton Rosa, economista-chefe da SulAmérica. "A tendência já existia, por conta do diferencial de juros, e ganha reforço agora." Maia, da GAP, não vê piso para o dólar no curto prazo e lembra que praticamente todas as apostas recentes feitas para um limite de subida do real fracassaram.
Rosa, da SulAmérica, também vê como outra conseqüência do maior fluxo de recursos para cá a maior freqüência de ofertas públicas iniciais (IPO, em inglês) no longo prazo. O investidor ganhará novas opções na bolsa, diz ele. Embora a promoção brasileira represente um incentivo para a retomada das ofertas de ações num ritmo mais consistente, a seletividade segue na ordem do dia, diz o gerente de Renda Variável da Paraty Investimentos, Luiz Henrique Carneiro. Ao mesmo tempo em que o Brasil fica credenciado para receber um fluxo novo, a aversão ao risco, trazida pela crise do "subprime" e o freio na economia dos EUA mantêm algumas dúvidas no ar.

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