terça-feira, 26 de agosto de 2008

O que olhar: o valor da empresa ou o preço na bolsa?

por Rodnei Riscali é diretor-executivo da Hera Investment
26/08/2008

Nos últimos dois meses, o mercado assistiu a uma enxurrada de ordens de venda de ações. As cotações derreteram sem que os compradores pudessem absorvê-las. A baixa registrada fez com que muitos analistas indagassem se o Brasil, que acabara de receber o tão esperado grau de investimento, ainda era a bola da vez para os investidores globais.
O país vive um momento de prosperidade econômica ímpar. O PIB cresceu 5,4% em 2007 e tem perspectivas de avançar neste ano e em 2009, 4,8% e 3,73%, respectivamente. A inflação medida pelo IPCA, apesar dos sustos recentes, voltou a ser projetada abaixo de 6,5%, o que corresponde ao teto da meta aceitável para o fim de 2008.
Já o índice Preço/Lucro (P/L) é o que mede em quantos anos um capital retorna na forma de dividendos ao investidor. Quanto menor, melhor. O P/L médio das ações brasileiras já esteve em 17 e agora está em torno de 13. Ou seja, os papéis nacionais estão sendo negociados, hoje, a preços bastante atrativos.
Os balanços trimestrais das grandes empresas, divulgados recentemente, mostram sinais de robustez. Isso se fundamenta em dados que não decepcionaram os investidores a ponto de reverem projeções para o médio e longo prazo.
No âmbito internacional, em meio a tantas perspectivas pessimistas e algumas até catastróficas, acompanha-se uma economia americana num ritmo de crescimento claramente menor, mas longe de um colapso. Já a tão falada bolha das commodities dá indícios de estar se dissipando, com os preços das principais matérias-primas próximos dos valores considerados justos. Seguindo a tendência de estabilização, o dólar também dá sinais de reversão de queda diante do euro.
Por aqui, diante de fatos e notícias tão positivos do lado da economia real, vemos, na face oposta, as ações sofrerem uma expressiva força de venda a ponto de muitas vezes não suportarem um pregão inteiro no campo positivo. A grande ironia é que, devido ao momento favorável que a economia brasileira passa em comparação aos demais países, o mercado interno fica como única opção aos "hedge funds" estrangeiros, que precisam cobrir prejuízos, saques e financiar compras de ações no mercado americano, universo este claramente em grande deságio. Tais movimentações, somadas, chegaram a retiradas no valor de US$ 15 bilhões.
Esses fundos de investimento representam uma modalidade de aplicação que reúne recursos de pessoas físicas e/ou jurídicas, por meio da aquisição de cotas. Os recursos desse grupo, administrado por uma instituição financeira, são destinados à aplicação em carteiras diversificadas de títulos e valores mobiliários, em cotas de outros fundos ou ainda em outros ativos disponíveis no mercado financeiro, dependendo do objetivo previsto.
Para melhor compreender seu funcionamento, é importante conhecer o objetivo de seu surgimento. Os "hedge funds" foram criados para propiciar uma redução do risco inerente às aplicações no mercado financeiro, visto que é raro se ter um investimento livre de risco. Considera-se que o risco de uma carteira é diferente do risco do ativo individual pelo benefício da diversificação no mercado. Quando se forma uma carteira de investimento, aplicando-se em diferentes classes de ativos, pode-se minimizar o risco de perda.
Essa modalidade, além de representar mais uma opção no mercado, favorece os pequenos e médios investidores, pois possibilita que invistam em ativos aos quais não teriam acesso, como títulos públicos, que até há pouco não eram vendidos diretamente ao pequeno investidor.
A partir daí, conclui-se que, atualmente, os "hedge funds" precisam liquidar prejuízos nos demais mercados e/ou levantar fundos para ir às compras - tanto no mercado americano como europeu, que, no final das contas, estão "baratos" e cujas perspectivas já não são tão desanimadoras. A atual abertura de oportunidade de compra, poucas vezes vista desde o início do movimento altista de meados de 2002, projeta-se em meio às notícias positivas que estão sobrando no mercado de ações brasileiro e que estarão no preço dos nossos ativos. Porém, ainda dependemos da inversão do fluxo dos investidores estrangeiros para que o cenário seja pleno. Nessa linha, os preços das ações no mercado para as empresas brasileiras não estão refletindo o valor real delas, o que está representado pelo bom momento que a economia está vivendo, além das perspectivas positivas a que foram projetadas.

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